domingo, 17 de julho de 2011

CRÔNICAS AVULSAS: CHICO BICO E O CLARÃO DE ESPERANÇA



_Wrinkles of the City Project, Silverlake, Los Angeles - extraído do site: http://jr-art.net (em 17/07/2011).


Íamos caminhando rumo ao nosso destino: Rua 13 de maio. As nuvens já adquiriam sua cor inefável do fim de tarde e o sol já se punha glorioso. Eu precisava ir ao banco e depois acertamos que iríamos jogar algumas partidas de sinuca no bar; nada de espetacular reside nisso. Contudo, quis o destino estragar ou melhorar nossos planos? Não sei; só sei que no meio do caminho, nos deparamos com ele, no ponto de taxi de esquina da rua: Chico Bico.

O sujeito era totalmente desconhecido da minha pessoa; pois moro em São Paulo e ele em Socorro - SP. Porém, conhecido de longa data do meu tio, que na mesma calçada que caminhávamos, assim que o avistou, no seu sagrado lugar, sussurrou-me ao pé do ouvido:

“Marcelo, não lhe diga nada. Apenas acene com a cabeça. Deixe-o falar por no máximo um minuto e diga que está com pressa. E vai saindo! Não lhe de prosa. Senão...”

Não atendi o conselho do meu tio, por dois motivos: não consegui me livrar da verborragia do Chico Bico, que era fascinante e da forma como contava as histórias, umas em cima das outras, emendando-as como um habilidoso cirurgião, sem perder o fio da meada e nem sequer tomava fôlego para isso. Passados alguns minutos, já era conhecedor de toda a genealogia de sua família, dos “causos” picantes da cidade de Socorro – SP e da sociedade em geral que ali reside, usos, costumes...

Voltamos pra casa. Meu tio frustrado e eu aos risos. Não fui ao banco e muito menos jogamos sinuca. Não preciso nem lhes dizer o motivo...

E o Chico Bico, por fim, assim que soube que eu era socorrense também, pois nasci na cidade, declamou até meus ouvidos gravarem o hino da estância de Socorro, pois, julgava que como era nascido nessa terra e embora vivesse em cidade grande: São Paulo - era obrigação minha conhecer cada uma das estrofes do glorioso hino. As duas primeiras estrofes (na enxurrada de informações que obtive dele) se perderam e hoje quando puxo na memória para escrever essa crônica, vejo que se esvaíram como o pó, quando é soprado. Mas a parte final, consegui gravar:

“Socorro, enfim, é festa e sol, trabalho,
encanto e luz,
da alvorada ao arrebol!
Suaves noites, gentil luar
Um clarão de esperança e de fé
Sempre e sempre a brilhar!”


Sim, verdadeiramente um clarão de esperança e de fé. Pois, somente no interior é que podemos ter uma experiência rica como essa, onde uma pessoa se desnuda em palavras a outra, mesmo sem nunca ter visto ela na vida pelo simples prazer de dialogar. Sem medo ou receio.

Aqui em São Paulo, andamos arredios e mal conversamos com nossos vizinhos, quiçá com um desconhecido...

Precisamos de mais Chico Bicos, que sempre e sempre estão a bilhar e nos fazem lembrar que a esperança por novos dias, ainda não está morta.


***
PS. Meu coração está em festa, pois essa crônica minha foi publicada no Jornal da Cidade - Socorro-SP, em 15/07/2011, edição 32 - http://jornal.redecidade.inf.br
Faço votos para que seja a primeira de muitas...
Ándele!

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