segunda-feira, 16 de abril de 2012
CRÔNICAS AVULSAS: EU AOS PEDAÇOS (PARTE II)
Acabo de vir do mercado ao lado de casa, fui tomar um capuccino que nunca está lá, aí acabo optando pelo tradicional café com leite, um pão de queijo e um salgado bauru. Acho que Freud ou Jung poderiam explicar esse meu mecanismo de sublimação...
Contudo, não sei por que ainda me iludo pensando no capuccino, sendo que lá no fundo, sempre ouvirei da atendente que: “A máquina hoje está quebrada Marcelo”. Ao que replico imediatamente: “Ontem, semana e mês passado – também”. Sempre que lá vou, repetimos esse estranho ritual e depois nos encaramo-nos por um breve momento e logo caímos na gargalhada de quem nada pode fazer. E olhem que já reclamei com o supervisor, gerente e o dono, mas nada de mudança. C’est la vie – como dizem os franceses, ou seria melhor: É o Brasil?
Hoje, porém, tive uma presença ilustre. A Sônia estava lá também tomando um café com leite, já que o capuccino só na páscoa do ano que vem!
A Sônia foi uma das três amas de leite que tive na infância. E como tive sérios problemas de saúde desde tenra idade e por um milagre estou hoje aqui deitando essas palavras nesse blog, precisei de três amas de leite, já que o leite da minha finada mãe – secou. Afora isso, até os 7 meses de idade – acreditem, tinha o mesmo peso que nasci, vivia na UTI, semi-UTI e internado em Hospitais de São Paulo.
Minha mãe me contava, que só com o dinheiro que ela dispôs com os gastos hospitalares e remédios dariam para comprarmos uma quadra inteira de terrenos onde moro hoje...
Confesso que se passaram muitos anos, aliás, mais ou menos uns 10 anos que não a via, ela custou a me reconhecer, e quando me apresentei, dizendo quem era minha mãe e o que ela tinha feito por mim, ficamos com os olhos marejados...
Ela disse: “Bem está, que homem vistoso você ficou hein! Nem parecia aquele menino mirrado de outrora, que cabia aqui ô, na palma da minha mão. Sua saúde era tão precária Marcelo, que a Neuza não conseguia sequer uma pessoa para ficar com você alguns míseros minutos – enquanto ela ia ao mercado ou farmácia, pois as vizinhas tinham medo de que você poderia morrer nas mãos delas...”
Demos algumas risadas, ela contou os dissabores e alegrias de sua vida, me disse rapidamente sobre seus dois filhos, sobre o término do seu casamento e sobre como sobreviveu a tudo...
Por fim, quando perguntou sobre a minha mãe, e eu disse que ela tinha falecido em 2009, suspirou fundo e se calou...
Ao que para quebrar o constrangimento lhe dei um abraço apertado de urso e disse firmemente olhando em seus olhos:
“Sou muito grato pelo que a senhora fez por mim, muito obrigado mesmo! Se estou hoje de pé ao seu lado, foi por causa do seu leite. E quanto às percas, não se entristeça, elas são inevitáveis, contudo, a grande diferença na vida é a resposta que damos para essas percas...”
Nos despedimos e cada um partiu com sua esperança e com seu sorriso largo no rosto, cientes de que valeu a pena todo o esforço. No meu caso, esforço e gana por querer viver e no dela, de que o melhor ainda está por vir, independentemente das agruras dessa vida. Ambos felizes pelo inusitado reencontro...
***
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Que história bonita e que coisa você tê-la encontrado tão inesperadamente. É sempre bom quando podemos agradecer um ato tão altruísta assim!
ResponderExcluirComo diria uma querida amiga....as "Cristocidências" da vida criadas pelo Papai do Céu, nosso Aba Pai!
ResponderExcluir"A saudade nos dá impressão de que sempre estamos num lugar e nossa alma em outro. Ela desregula nossa bússola e nos faz querer fugir pro passado, o que é impossível"...Mas um abraço nos acalenta a alma, nos coloca novamente no rumo e nos faz ser gratos por momentos tão especiais como esse!
(E vale aqui reafirmar...De fato o teco de gente se transformou num vistoso homem!)
Lu.