Grafite
dos irmãos: Os gemeos.
A priori Euclides da cunha dá o
tom: “O sertanejo é antes de tudo um
forte [...]” é com essa frase que ele abre seu livro monumental: Os
sertões. Eliosmar – conhecido popularmente no prédio onde eu trabalho por Eli,
não foge a essa regra. No primeiro dia em que o conheci, ele me deu um largo sorriso
e um forte aperto de mão ao me cumprimentar, e disse:
“Seja
bem-vindo meu jovem!”
A amizade foi instantânea, pois
quando cheguei nesse primeiro dia de trabalho, vinha com um livro na mão, que
estava lendo e que já não me recordo mais o seu nome (sintomas da minha idade).
E ele curiosamente me perguntou qual era o nome do livro e do que se tratava –
foi o suficiente: a magia da amizade se instalou e ficou.
Sexta-feira passada, ele saiu
de férias, e depois me confessou que não voltaria mais. Iria morar em Paulínia,
interior de São Paulo e perto de Campinas. Disse que já não agüentava mais São
Paulo e sua estrutura caótica. Durante os seis meses que estou nessa empresa,
conversamos todos os dias antes do meu expediente sobre os mais variados
assuntos, variados mesmo: desde investimento em ações na Bolsa de Valores de
São Paulo, a troça de praxe dele sobre os fracassos contínuos do meu Palestra
nesse campeonato brasileiro (que diga-se de passagem é um dos piores de todos
os anos, pois não empolga em nada).
Eli é um daqueles sujeitos
destemidos, veio do nordeste para São Paulo sem nada, sem parentes, sem
documentos, sem dinheiro – trazia dentro de si apenas um sonho: ser feliz. E
conseguiu, pois é pai de dois filhos – ambos formados, casado há 30 anos com mesma
mulher, possui casa própria na zona leste, carro e como trabalhou muitos anos
no jornal Estadão conseguiu sua aposentadoria; e mesmo assim continuou trabalhando
como porteiro nesse prédio que trabalho, há ininterruptos 11 anos. Orgulhava-se
em me dizer que nesses longos 11 anos de porteiro, nunca tinha faltado, exceto
uma vez que sua irmã adoeceu seriamente. Detalhe, ele acordou durante esses 11
anos, às 3h50 da manhã todos os dias, e lembrem-se porteiros trabalham em
regime de escala, portanto, ele trabalhava de domingo a domingo, com apenas uma
folga. Homem de fibra e não como muitos: pusilânimes que conheço por aí...
Recentemente estourou na
internet, principalmente nas redes sociais, o preconceito entranhado em alguns
brasileiros, com os nordestinos que votaram na Dilma, nessas eleições
presidenciais de 2014. Eli, curiosamente, veio da mesma terra de Lula:
Garanhuns, que fica no agreste de Pernambuco. Com a proximidade das eleições,
esse tema se tornou um dos nossos preferidos na meia-hora que tinha, antes do
trabalho, pois como não suporto atrasos, chego sempre mais cedo um pouco. E em
nossas tertúlias políticas, ele me confessou:
“Não
votarei no PT, não suporto continuísmo!”
Como se vê, o Brasil ainda não
está perdido.
Eli partiu, deixou saudades e a
firme promessa de que quando as coisas estiverem estabilizadas em Paulínia para
ele, vai me convidar para um churrasco com sua família lá, e claro – irei com o
maior prazer. Quando nos despedimos na última sexta-feira; disse para ele uma
frase muito preciosa do Gilberto Freyre, um dos maiores sociólogos do nosso
país:
“Uns
colecionam medalhas de ouro; outros imagens de santos; uns prata; outros,
marfins. Eu coleciono amigos.”
E ele me retribuiu, citando de
cor seu poeta predileto –Patativa do Assaré:
“Eu sou de uma terra que o povo padece
Mas não esmorece e procura vencer.
Da terra querida, que a linda cabocla
De riso na boca zomba no sofrer
Não nego meu sangue, não nego meu nome
Olho para a fome, pergunto o que há?
Eu sou brasileiro, filho do Nordeste,
Sou cabra da Peste, sou do Ceará.”
Mas não esmorece e procura vencer.
Da terra querida, que a linda cabocla
De riso na boca zomba no sofrer
Não nego meu sangue, não nego meu nome
Olho para a fome, pergunto o que há?
Eu sou brasileiro, filho do Nordeste,
Sou cabra da Peste, sou do Ceará.”
Ao que lhe
disse rindo:
“Ei, mas você é de Pernambuco – não do Ceará!”
E ele me
respondeu de chofre:
“No fundo Marcelo, somos uma coisa só: pó e ao pó tornaremos todos um dia!".
Até logo
amigo...
***
Senhor Eli representa a maior riqueza que temos: a perseverança! Sendo ele nordestino, possui uma humildade espiritual e uma garra de vencer sem igual, como todos! Adorei! Beijos!
ResponderExcluirOi Alexandra,
ResponderExcluirFico muito feliz que tenha curtido essa crônica, e o Eli, é assim mesmo...
Boa Tarde! Obrigada pela linda partilha!
ResponderExcluirShirley Cavalcante
Magnifico!
ResponderExcluirAucenir Gouveia