quinta-feira, 5 de maio de 2011

CRÔNICAS AVULSAS: O DIVINO & EU



LES OISEAUX (1914), DE FRANZ MARC


“Tudo no mundo é duplo: visível e invisível
O visível, de resto, interessa muito menos.”


_Cecília Meireles (1901-1964), poeta carioca.


Ele chegou no dia 07 de abril...

Dia ruim aqui em São Paulo, com muita garoa cortante, que só quem mora aqui conhece bem, sem contar o frio. Veio de uma viagem longa de avião, do aeroporto Internacional de Ponta Porá em Mato Grosso do Sul com destino para Cumbica - Guarulhos. Depois, mais algumas horas de carro, e cá estava ele em meu lar – na green house.

Seu ex-proprietário disse-me que ele era de uma cidadela isolada no mapa; que ficava um pouco mais a frente de Água Clara (MS) entre a divisa de Uberlândia e Uberaba (MG). Fiquei curioso, e perguntei ao mesmo o nome dessa cidade, ao que ele respondeu sem pestanejar:
- Ela se chama: Divinópolis e fica ainda em Mato Grosso do Sul, mas coladinha com Minas Gerais.
- Pronto!
- O que disse assustado o vendedor.
- Acabei de dar o nome ao bicho, que ainda é um filhote.
- Qual?
- O Divino. Esse será seu nome.
- Está certo! Disse o vendedor. – Isso o fará lembrar das suas raízes e da sua terra.
- Cidade de nome estranho hein? Disse a ele.
- O pior é que você nem sabe.
- O quê? Perguntei extremamente curioso, igual a uma criança...
- Essa cidade, só tem 777 habitantes. É menos do que Borá em São Paulo, que tem segundo o IBGE 804 habitantes, e que goza do status de cidade com menos habitantes do Brasil.
- Mas o IBGE não fez a pesquisa lá?
- Não sei não moço, só sei que é assim. Conhecemos as ferramentas... mas não os meios!

Quando o ilustre vendedor filósofo e enigmático foi embora, fiquei observando seus passos na garoa, era o tipo do sujeito estranho e misterioso, desses que encontramos uma vez na vida e outra na morte. Notei, que embora já avançado em idade, ainda mantinha certo brilho no olhar, e que era um profundo conhecedor dos recantos do nosso Brasil, embora, não fosse leigo em geografia, era notória sua superioridade sobre mim; talvez, devido sua profissão o fez tão profundo conhecedor dos rincões do nosso Brasil.

Antes de ir embora, ele me disse:
- Cuida muito bem do O Divino, ele me deu trabalho enorme para trazê-lo pra ti.
- Sim, deixa comigo. Respondi com um sorriso amarelo e encabulado.

O Divino, já no primeiro dia, deu mostras que fazia jus ao seu nome. Não perdeu tempo e fez o que melhor sabia fazer...
Também; pudera me custou um olho da cara; e não digo o preço que paguei, pois minha mãe me dizia, que quando revelamos isso o bicho perde o encanto e a força. Isso é segredo, guardado a 7 chaves...

Engraçado, que assim que botei os olhos nele, e ele me encarou, percebi uma tênue sintonia entre nós, assim como tive com a “opéra à sauvetage” em francês ou em alemão “Rettungsoper” e finalmente em português: “ópera do salvamento” de Ludwing van Beethoven, que é a épica: “Fidélio”. Que foi a única ópera composta por Beethoven; e que me toca a alma e encanta meus ouvidos - quando ouço ela.

O responsável pela sua segurança, já que ele é muito precioso e valioso, será meu “meio” cachorro: Le Sansão. Que ficará na contenção, dando apóio ao mesmo, na minha ausência.

Um conhecido meu, só de ouvir falar das maravilhas do bicho, chegou a me oferecer a bagatela de R$ 2.500,00 reais pelo mesmo, ao que lhe disse que eu gastei mais que isso, só no preparo da casa dele. Isso sem contar, alimentação, bebedouro etc. O mesmo (meu amigo), fazendo careta e duvidando de tudo, me pediu um detalhamento de tamanho investimento, ao que lhe relatei:

- Olhe, a casa dele é feita de madeira nobre, de lei, pois como o bicho vivia num calor dos diabos em Mato Grosso do Sul, ela tinha de ser assim. A madeira usada na construção é a Jacarandá Mimoso, e cientificamente conhecida por: J. mimosaefolia; dizem que ela é aquecida, e como aqui faz frio em São Paulo, só poderia usar ela. Um serralheiro aqui de São Paulo, amigo meu, construiu sobre encomenda ela pra mim. Nisso eu gastei R$ 2.770,00 reais, por ser um trabalho extremamente artesanal.
Já o bebedouro é de cristal, material importado. Me custou na promoção na loja Cobasi R$ 170,00 reais.
A comida é importada também, pois O Divino merece, ela vem do Chile, grãos nobres e selecionados, só o quilo é R$ 70,00 reais. A capa protetora é de pura seda indiana, importado também, e o metro da mesma, me saiu por R$ 107,00 reais. O osso de baleia Orca da Nova Zelândia (pois lá é que estão as melhores), só o quilo, é R$ 177,00 reais, e você sabe O Divino precisa disso, pois é parte integrante de sua alimentação...

- Porra Marcelo, pára! Você é louco?
- Minha mãe me dizia, que louco é quem faz loucuras, e isso não é uma loucura!
- Se isso não é; o que é então?
- Brother, ter gastado tudo isso e ainda poder ter O DIVINO na green house, não tem preço...

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