segunda-feira, 28 de maio de 2012
CRÔNICAS AVULSAS: O PÁSSARO. A LENDA. SEU NOME: R$ 1,99.
Tentando esquecer os amargos da vida, olhando para o horizonte sem fim, num belo dia enquanto eu tomava meu café da tarde, ele chegou, ou melhor, pousou numa das linhas do varal de casa.
Tinha um olhar de medo e embora depois fosse constatar que era bem manso, naquele dia estava arredio. Creio que exausto também, pois há quanto tempo poderia estar voando? Com fome, sede, e isso há quantos dias? Sinceramente não sei.
Meu pensamento imediato foi de ajudar, pois como é um pássaro de gaiola e legalmente legalizado sua comercialização no Brasil, pois não se trata de uma ave silvestre, deveria estar sofrendo já que não estava em seu habitat natural.
Logo, e por uma coincidência do destino, restava um pouco da ração do finado lendário pássaro que tínhamos em casa e que morreu após o falecimento da minha mãe, cujo nome era: O Divino. Então, espalhei a ração do finado no chão de casa, e fui me esconder atrás da porta, como pensei, foi: “batata”. Ele voou rapidamente para dentro da casa a fim de saciar sua fome e eu rapidamente fechei a porta. Corri no banheiro, peguei a primeira toalha que vi e joguei em cima dele. Capturado o passei para a gaiola.
Na primeira semana fizemos um tratamento intensivo, ou seja, uma alimentação rica e balanceada, que incluía desde vitamina gold na água, até osso de baleia orca, para fortalecimento de cálcio e ferro no seu organismo. Obviamente, tinha: Alpiste, linhaça, aveia, painço, colza, níger, milho moído, farelo de trigo, óleo de soja degomado, calcário calcitico, lignossulfonato de cálcio, ácido propiônico, óxido de zinco, monóxido de manganês, vitamina A, vitamina B1, B2, B6, B12; vitamina D3, vitamina E, vitamina K3, senha, nabão, painço verde, painço vermelho, arroz em casca, carbonato de cálcio, fosfato bicálcico, sulfato de cobalto, iodato de potássio, sulfato de manganês e sulfato de zinco.
Fora o ovo de galinha da Angola (nunca devemos servir ovo das galinhas brasileiras) dá azar dizem os doutos, maçã argentina, jiló australiano, almeirão chileno...
Enfim, depois desse mega power tratamento, passado uma semana, o Canário do Reino, estava vistoso e imponente, fazendo jus ao seu nome, por ser ele do Reino. Contudo, ainda não tinha dado um pio sequer, mas pelo porte físico, no primeiro dia que ele chegou, soube que era um macho, pois, as fêmeas de Canário do Reino, não cantão, somente os machos.
Eis então que o levo para fora de casa, na nossa varanda para que eu e ele pudéssemos tomar sol. E sucedeu que um senhor criador de aves, chamado Arilton, que é meu vizinho por sinal, vendo ele na varanda tomando sol, mas como passava de carro, gritou: “Marcelo, quanto custa?” Até então, isso sequer tinha passado em minha mente, ou seja, em vendê-lo, daí falei de sobressalto: “Um mil e noventa e nove!” Mas como ele passou de carro e foi tudo muito rápido, acrescido o barulho da rua, passado alguns minutos, que estava em casa lendo um livro, a campainha tocou, era o próprio Arilton. E já me falou de chofre quando abri a porta:
“Eis o dinheiro.”
E me passou as mãos uma nota de R$ 2. Ainda me disse condolente:
“O troco é seu”.
Ao que lhe respondi:
“Entendeu errado, ele custa um mil e noventa e nove reais!”
“Porra Marcelo, tem bico de ouro?”
“Não vem ao caso Arilton, mas entre e venha ver a elegância desse pássaro.”
Quando entramos na varanda, lá estava o Canário do Reino, tomando seu sol, verde como a mata amazônica em toda sua exuberância.
O Arilton quis saber como ele veio parar em minhas mãos. Ao que lhe disse:
“Sou um meio-escritor, e todos nós sabemos, que determinadas histórias nos escolhem, e não nós os temas. Da mesma forma, acredito que esse Canário do Reino, me escolheu para ser seu dono, pois foi ele que veio até a mim, num fim de tarde vazio.”
Fez uma cara de profundo pensador ornitólogo, e disse:
“Qual seu nome? Não é bom que fique sem!”
Ao que lhe respondi:
“Já que você confundiu seu valor, ficará esse mesmo que você pensou, ou seja, R$ 1,99!”
Nesse exato instante, após ser batizado R$ 1,99 começou a deixar sua poesia pairar no ar, pois começou a cantar e nunca mais parou desde então, e seu canto entrou em minha vida e fez o que quis, hoje até posso afirmar que sou mais feliz...
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